terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Pequeno ensaio sobre incertezas

Me curvarei diante da verdade como quem nada quer. A verdade seja dita como água de apagar incêndio. Se a verdade é o caminho, o primeiro passo é abrir os olhos. Se a verdade é o fim, o primeiro passo é seguirmos juntos, cada um no seu caminho. Como me encontro semi-desperto, sei da mentira, mas não sei da verdade. O que é verossímil é real, mas não é a verdade que eu quero. Vivamos em guerra pela paz e mentindo para viver.

O Grande Temporizador Programável Microcontrolado

É tudo tão pequeno e mínimo
O micro controla o macro
Sinergia se faz onde me sento
Sinto o vento dos tempos
Acabo de torcer meu coração
Que grita e toca o impossível
O menor dos sopros
Clama pela atenção do maior dos cães
Um temporizador programável microcontrolado
Algo tão amável quanto o bionismo
Chega agora em suas mãos
Deixe os grãos no chão
A Terra acolhe nossas escolhas
E escolas
É tudo tão mínimo
Que minhas sinapses são retrocesso
Não caibo em mim de tão grande que queria ser
Deixe o tempo para quem sabe do que se trata
Somos todos um amontoado de micros
Pseudo-Temporizados e controlados
Floresce então minha vida e morre
Como a Terra escolhe

sábado, 19 de dezembro de 2009

Não sei se podemos ver futuro na borra do café, mas sei que podemos ver nosso passado refletido no liquido preto. O passado deve ser sempre bonito, mesmo que embelezado pelo alívio. O menino anda reproduzindo um lema, que não é seu, mas foi adquirido, “a vida é sofrimento”, é isso que lhe salva todos os dias. Isso lhe permite não ser amargo com as pessoas e agüentar o tranco.
Os homens são bípedes e isso significa que andam com duas pernas, além disso, alguns deles só conseguem pensar exercendo essa faculdade. Por isso o menino anda, pra pensar, pra sobreviver, ele anda porque se ficar parado ele esquece que a vida é sofrimento e pode acabar se matando por isso.
A rua é o motivo de existência por excelência. Lá o homem encontra os outros homens. As pessoas de verdade são aquelas que não conhecemos. Os pais, o irmão, os amigos, não são pessoas, não representam nada. Eles se destacam para se tornar “José”, “Pedro”, “Tostes” ou o que seja. Pessoas são os outros e os outros são o motivo das nossas vidas.
Sair de casa não é apenas ver os “outros” mas ser um deles, prazer encantador esse de ser anônimo.
Gosto dos personagens constantes da rua: aquele mesmo velho no bar, aquela mesma menina linda com a qual sempre trocamos olhares, aquele mesmo mendigo, enlouquecendo aos poucos.
Não sei se é possível ver o futuro de qualquer forma, mas sei que a cidade está refletida no café. Ele nos chuta para fora de casa e nos mostra que a vida é sofrimento, o café é um “outro”.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Era uma viagem ao inimaginável
uma efervescência côsmica
se deleitar com aquilo era obrigatório
epicurismo serão as histórias contadas
banquetes a mesa, fartos
visões iridescentes de numa nuvem eterna
velocidade se tornou termo descabido
aqui, aqui, aqui
se de olhos fechados estava claro
abri-los significava nascer novamente
e manter aberta a mente era como fechar uma torneira
o cérebro se mesclou ao coração
e estômago ao palpável
queria um vocabulário com infinitas possibilidades
para infinitas descrições
e fica aqui nem o meu êxtase
porque não posso limitar o pôr-do-Sol
a algo laranja e belo
é a morte
era realmente uma viagem ao impossível
morte à poesia,
enquanto não houver um vocabulário poético
à vocês selvagens,
baterei num tambor e entenderão
isso basta!!

domingo, 6 de dezembro de 2009

As viagens de José: a primeira vez que eu vi o mar

A Primeira vez que eu vi o mar eu era um pouco menos gente, a estrada havia tirado tanto de mim, tanta carne e tanta vontade que eu apenas seguia, sem olhar placas e pessoas que por mim passavam. Não lembrava mais da minha casa ou das pessoas que eu amava, eu era sozinho em um mundo infinito e desabitado, eu pensava que isso era paz e pensava que era o que eu queria.
Então apareceu zombando dos meus olhos o infinito por excelência, aquele que parece fazer o céu lhe seguir, coisa absurda o mar. Eu o olhei como uma criança, e a paixão dos homens antigos se apossou de mim, era preciso lhe enfrentar, estava na minha natureza, entendi que era para isso que o homem foi criado, cada individuo sobre a terra em suas casas ou na estrada, eram traidores da espécie que nasceu apenas para triunfar sobre o mar.
“Parece que não acaba nunca né? Esse bichão engole a gente e deixa nossas mulheres chorando, achando que não volta mais. E então, ele nos cospe triunfante e devolve uma coisa magra e salgada para casa. O mar é pior que a guerra, meu amigo”. Era um homem negro cuja idade era impossível calcular, que vendo meus olhos encantados, disse-me essas coisas... E eu, me vi novamente como uma criança sob as palavras maiores de um velho viajante.