quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Eu não sou daqui, eu fui criado aqui, conheço os nomes das ruas e sei para onde elas levam, reconheço os rostos das pessoas e o companheirismo dos amigos que fiz. Mas bate na cabeça a frase fria, feito o ferro que tenho dentro de mim: eu não sou daqui.
Isso não mudará jamais, reconheço no sotaque uma impossibilidade de reação, um conforto familiar, um espanto de filho encontrando a mãe, perdida há anos, em outras terras, em outro lugar, lá, no lugar de onde vim.
Quando o sorriso é outro, e os olhos (sempre mais velhos por lá) fazem a falta que só noto quando estou mais perto (de alguma forma mais perto de mim). Ando pelas ruas, andar meio mineiro... Todo mineiro deveria ter um canivete, penso me lembrando de Sabino, quando terei o meu?
Fui menino mineiro o suficiente? Crescido tão longe de lá, cada vez mais longe e mais saudoso. Não conheço minha terra. Mas reconstruo-a toda em mim, em meu peito bate o solo mais rico e o povo mais velho, em meus olhos, a eterna desconfiança do mar, pois se lhe conheci cedo, ele nunca me pertenceu.

domingo, 26 de outubro de 2008

infanticidium

- Mãe!
- Que?
- Falta muito tempo pra eu parar de estudar?
- Um pouco!
- Um pouco quanto?
A mãe, pacientemente, conta, nos dedos, os anos e diz:
- Ahh, faltam cerca de 14 anos.
- Hmm! Catorze anos é muito, né? Com quantos anos eu vou tá?
- Vinte e um anos.
- Poxa, com 21 anos, eu já vou ser adulto e até lá, não vou ter tempo pra brincar! =\

(Baseado numa história real)
dedicado a um grande amigo, Peppe!

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

À LA BUKOWSKI

Acendo um cigarro, embora não fume, não gosto da fumaça, do sabor e ainda sou alérgico, mas fazem três noites que não durmo. Hoje será a quarta! Preciso passar o tempo, por isso do cigarro, li todos os livros que faltavam terminar, madrugada a dentro (preciso comprar mais, enquanto isso vou ficar com a nicotina).
Encosto na janela e dou a primeira tragada... Desisto do cigarro... A rua está vazia, não passa sequer um carro, olho pro céu na esperança de ver estrelas e lua, mas está nublado. Volto pro sofá e ligo a televisão, zapeio e não encontro nada interessante. Desligo a tv.
Apenas o sofá, a escuridão, eu e meus milhares de pensamentos... Penso no amanhã, no ontem, no que não fiz e devia ter feito, no que fiz, no que fiz e não devia ter feito, penso nela e em outras milhares, na janela de frente a minha que também esta com a luz acesa (quem será que esta acordado? se é que não esqueceram a luz acesa... que importa? seja quem for, esta lá e não aqui...), penso de novo em todas essas coisas e outras que me vão ocorrendo.
Abro um vinho, quem sabe se ao embebedar-me não durmo? A garrafa ta quase no fim, e tudo que consigo é ficar bêbado agitado. Jogo a garrafa contra a parede, espatifa-se e mancha de uma tonalidade avermelhada a parede e o sofá que são brancos, ainda havia um pouco de vinho... Desperdício. Dane-se!
Faço um café, preciso voltar à sobriedade. Ainda são 03h20min da manha... Enquanto tomo o café rabisco uns versos, umas linhas tortas de um conto... Não estou inspirado. Repouso a caneta e volto pro sofá.
Ligo a tv, novamente, zapeio. . . Finalmente alguma coisa, ta passando um filme do Chaplim!...

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Prosopopéia

Manequins e principalmente bonecas são coisas que sempre me aterrorizaram. Seus olhos realistas compenetrados com os meus, me transmitem uma certa agonia. Tenho sensação, que esses seres, só ficam na espreita, esperando que eu os encare, para que possam ganhar vida, seja pra me assustar, ou pra se libertarem de toda aquela mediocridade estática.
Desde a minha infância, isso sempre me incomodou. Minha irmã, possuía dezenas de bonecas, sendo uma delas, a mais diabólica, um ser com mais de um metro de altura. Eu não atrevia me aproximar daquela coisa, pra evitar seu olhar cínico e debochado, que esboçava um sorriso, que só eu era capaz de entender.
Ultimamente isso não tem me incomodo tanto, até porque, fazem 30 anos que espero que tais seres, que julgo inanimados, ganhem vida, e até hoje, por sorte, isso nunca ocorreu. Fico imaginando o dia que isso acontecer, ou melhor, prefiro nunca imaginar, caso um dia isso ocorra, por favor, me internem!
Sempre fui muito isolado, sozinho. Vai ver, esse seja o problema, o motivo das minhas aflições. Matutando, cheguei a uma conclusão. Precisava de companhia! Nunca fui bom com relacionamentos. Desde de pequeno, sempre achei que fosse morrer solteiro, e pelo jeito, minha profecia está se cumprindo. Então pensei em algo mais prático. Comprar um gato. Toda passividade de um gato, não me traria problemas.
Estava satisfeito com a idéia de ter um gato em casa. Porém essa satisfação foi acabando na medida que comecei a desconfiar do gato. O maldito gato não me deixa em paz. Seus olhos amarelos acompanham todos os meus passos. Minha privacidade, que a anos demorei a conquistar, estava sendo destruída por um gato. Nem na hora do banho, aquela bola de pêlos me perdoava. Imagine, você, se despindo, na frente de um ser, te olhando, ou melhor, te encarando. Maldito gato pervertido, o que será que passa na sua cabeça, pra ficar me olhando, de tal maneira, enquanto estou nu?
- Maldição, Suma daqui, gato demoníaco!

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Meu gato é um poeta maldito que nunca escreveu um livro, mas sabe fazer tipo! Ele anda meio sombrio, pelo canto, olhando de lado, sempre de lado. Comunga com a noite, passando horas encarando a lua, para todos os gatos que passam, ele parece terrível.
Meu gato tem uma paixão platônica, um miado indiferente e um ar superior! Meu gato mudou seu nome de demônio brasileiro (tinhoso) para um mais adequado, algo inglês e frio que ainda não decorei. Meu gato mia alto “Edgar Alan Poe!” (Não alguma poesia ou conto dele, mas apenas o nome do autor).

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Perfeitinho Indolente

Perfeitinho Indolente
Queria tudo a sua volta
E lógico, tudo perfeito
Bastava pensar no que queria
e pronto!

Até que um dia
Perfeitinho Indolente
Precisou de Companhia
e ali surgiu simplesmente
E como se não bastasse
Exigências cobriram como artilharia

O que talvez Perfeitinho Indolente
nunca fosse notar
é que todos possuíam vontades,
e com Comapanhia, não poderia ser diferente

- não quero brincar – dizia a Companhia
e Perfeitinho Indolente a cara trancava
- Não pode ser assim – a Companhia insistia
e Perfeitinho sentiu-se desafiado
porém a Companhia nada temia
e água nos olhos surgia daquele desprovido

Perfeitinho Indolente
Farto de tantas controvérsias
Berrou, berrou e berrou
Até que um alarde, todos perceberam
O mundo temia o pior

Alguns comemoravam a bravura da Companhia
Toda apnéia mantida há anos
Fora libertada de súbito
Todos acordavam do sonho de liberdade
Para realidade que há tempos aguardavam

Aos poucos, o mundo fora se contagiando
a liberdade gritava mais alto
e Perfeitinho Indolente
num surto de desespero
se rendeu

e infelizmente
Companhia despertou de seu sonho mais belo.

domingo, 12 de outubro de 2008

Seu Astolfo

I

Seu Astolfo caminhava nos seus comuns passos lentos pelo seu jardim, mas de forma tão natural que parecia deslizar, ao chegar à frente do seu banco favorito parou. Deu uma longa olhada ao redor, suspirou, e orgulhou-se do belo jardim que tinha e que ele mesmo cuidava, apesar de sua avançada idade. Sentou-se. Um vento frio soprou e ele Chegou um pouco mais para o lado de forma que ficasse no sol.
Mergulhado em profundo pensamento, seja lá o que um homem idoso pensaria, exibia certo sorriso... Talvez estivesse pensando na sua juventude, nas coisas que realizou, talvez no pé de amora do qual tanto gostava e que começava a dar frutos... mas foi interrompido por um outro sorriso, da sacada a doce bel sorria-o, o que fez com que seu Astolfo apresentasse um sorriso ainda maior. De abrupto ela virou-se e correu. Em questão de segundos entupia seu astolfo de perguntas, como fazem as crianças pequenas e curiosas.
-Vovô, o que você ta fazendo no sol? Por que ta sentado ai sozinho? – ele apenas sorriu. E como se aquilo respondesse tudo ou ignorando as próprias perguntas Mabel prosseguiu- -Me conta uma história?
-Uma história? Mas isso são horas pra histórias? Conto uma a noite!
-Mas eu quero uma agora, de noite o senhor vai acabar não lembrando ou vai dizer que me conta uma amanhã, e vou acabar ficando sem ouvir história nenhuma. -Riu com a esperteza da neta, pigarreou e começou: “Era uma vez”... (e colocou na história tudo que as meninas, principalmente as de seis anos, gostam que tenham: princesa, príncipe encantado, um reino bonito, vilão...).
A verdade é que ele sempre gostou dos violões, eles que tinham graça, sem eles todas as histórias seriam enfadas, então caprichou no vilão que criou, mas tanto que sua neta ficou com medo e desistiu de ouvir a história. Contudo não se chateou de forma alguma, o seu Astolfo; imaginou o final da história na sua cabeça e riu ao perceber que ficaria muito mais aborrecido se tivesse que destruir seu vilão.

Homunculu

Meus passos são curtos, finjo ter a paciência dos sábios, a gravidade dos eruditos que desistiram da vida. Fumando opinião, calculo quanto tempo deixo a mão passar pela grade, sem que ela se suje demais.
Meus óculos redondos, de grau alto, coisa de quem nasceu assim e finge que cansou as vistas com segredos. Menino que no fundo, tinha tudo para ser feliz, mas preferiu não ser.
Minha brancura meticulosamente preservada. Meu Brecht meticulosamente decorado. Olho como quem espreita, enceno como ator de quinta. No meu jornal letras francesas, no livro um alemão arcaico, nas mulheres que amei uma melancolia fria, digna.
Acabaram-se as bandeiras, a esperança é a ilusão dos povos, o novo ópio. O silencio da minha voz é o discurso de uma geração em choque. Eu li as palavras dos bardos na minha juventude, hoje não há nada que faça meu peito bater.
Eu fumo a opinião que quero ter, bebo toda razão de que preciso, e engulo em frio comprimido o amor e a inspiração que me falta para viver.